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quarta-feira, 9 de março de 2011

Como a Ferrari distorce a realidade


Contei ao pessoal do Jalopnik que eu estava de saco cheio da Ferrari e queria contar o porquê para algumas pessoas. Eles disseram que eu poderia fazer isso aqui. Acompanhem o que eu vou dizer, talvez leve um tempo.

Acho que começou em 2007 quando eu ouvi que a Ferrari queria saber qual pista de testes nós iríamos usar para o teste da 599 GTB na Autocar, mas na verdade a origem deve ser bem anterior a isso. Porque ela queria saber isso? “Porque sim”, disse o homem no escritório da Autocar, “Agora a fábrica manda uma equipe de teste para o circuito que escolhemos para que possam otimizar o carro e tirar o melhor desempenho dele.” Eles foram à pista, testaram por um dia, bateram o carro, voltaram à fábrica para consertar o carro, voltaram, testaram e então nos convidaram para guiar esta 599 “de fábrica”. Devem ter se divertido.


É triste dizer, mas o prazer de dirigir uma nova Ferrari agora é quase que totalmente erradicada pela dor de cabeça em lidar com a empresa. Por que estou perdendo tempo contando isso para vocês? Porque farto de tudo isso. Saiu do controle; a ponto de que logo será inútil acreditar em qualquer coisa que você leia sobre seus carros nos lugares de sempre, porque a única de forma de se ter acesso [a seus carros] é jogando de acordo com as suas regras.

Assim como qualquer um que ainda tenha metade de seus neurônios, tenho sido tolerante com a Ferrari porque ela é, bem, a Ferrari – a mais famosa marca de carros velozes e a fabricante dos carros sobre quais todos querem saber. Grave um vídeo fazendo drifts com um novo Jag XKR no YouTube e 17 pessoas vão assisti-lo; faça o mesmo com uma 430 Scuderia e a audiência pula para 500.000 fácil. Como jornalista, estes números fazem você relevar uma tonelada de baboseiras, mas já cansei. Não me importa se nunca mais pilotarei uma Ferrari novamente, se isso significar que nunca mais terei que lidar com a insana máquina de comunicação e continuar mentindo sobre até onde a Ferrari distorce as regras para conseguir o que quer. Tudo bem, porque acho que não serei recebido em Maranello por muito tempo. O que é uma pena, a comida é maravilhosa.

Quão ruim foi? Eu honestamente não sei por onde começar. Talvez a 360 Modena fornecida para a imprensa que chega aos 160 km/h (100 mi/h) dois segundos mais rápido que um carro que testamos de um cliente. Você permite alguma margem para máquinas “com cheiro de fábrica”, mas aquela era estupidamente rápida e produzia o som dos carros que Schumacher usava nos finais de semana da época. A Ferrari nunca admitirá que os carros que cede à imprensa são preparados, mas tem a ousadia de aparecer nos testes de fim de ano de qualquer uma das grandes revistas europeias com dois carros. Um para testes de reta e outra para testes de dirigibilidade. Afinal, é isso que acontece quando você compra uma 458: eles entregam duas para cobrir os dois tipos de uso, não é mesmo? Não. Tudo isso fede. Em qualquer outra indústria isso não aconteceria. É desonesto, mas todas as revistas engolem a seco porque têm medo de não serem convidadas para guiar a próxima nova Ferrari.

Lembra-se da incrível 430 Scuderia? Era um carro e tanto, e ainda é. Uma revista inglesa seguiu [os testes], mesmo com todas as trapaças porque os carros pareciam condizer com o que um cliente iria dirigir, mas então durante a sessão no dinamômetro, os pneus “de fábrica” simplesmente grudaram nos rolos/cilindros.

E este é o problema: o quão paranoico você precisa ser para colocar um pneu ainda mais aderente na Scuderia? É o mesmo que Kid Bengala tomando remédio para ganhar uns cinco centímetros na ferramenta de trabalho. É como se você, segundo a sua própria assessoria, não fosse o líder de mercado e fabricante dos melhores esportivos na atualidade, não é?

O que a Ferrari claramente não consegue ver é que sua estratégia para vencer todos os testes a qualquer custo é completamente contraproducente. Primeiro, ela desmerece o incrível trabalho de seus próprios engenheiros. O que dizer da 458 se a única maneira que a fábrica permite emprestá-la para uma revista é caso um notebook seja ligado a ela a todo instante, com uma equipe especial passando diversos dias na pista escolhida para ajustar o carro? Diz que eles são completamente doidos – um comportamento que parece ainda pior quando marcas rivais simplesmente entregam seus carros com nada além de um pedido educado para que você evite batê-lo muito forte, e então o devolva uma semana depois.

Segundo ponto: a internet serve para três coisas: pornografia grátis, Jalopnik e divulgar informação. Quinze anos atrás, se a sua 355 não fosse tão rápida quanto o fabricante afirmou, você podia torrar a paciência do vendedor, reclamar no clubinho local dos donos de Ferrari e só. Hoje em dia você espalha sua mensagem ao redor do globo e qualquer mané a lê em questão de minutos. Assim, quando usamos uma 430 Scud de um proprietário porque a Ferrari não quis nos emprestar um carro de teste, ela foi destruída em linha reta por um 911 GT2 e um Lambo LP 560-4, apesar de todos os testes “oficiais” sugerirem que ela é mais rápida que o cometa Halley. Os fóruns entraram em polvorosa, alguns donos da Scud tiveram razão em sentir que não receberam o carro sobre o qual leram em páginas e mais páginas. Isso é o carma lhe aplicando um belo tapa na cara.

É o nível de controle que eu acho profundamente irritante e até nocivo à marca. Uma vez que você sabe que é preciso toda uma equipe de suporte e duas 458s para fornecer todas aquelas estatísticas maravilhosas, todo o brilho do carro vai embora. A mensagem da Ferrari é simples: a não ser que você siga as nossas regras do jogo, você está fora da lista.

Que regras são essas? Fora essa parte dos testes de pista; os jornalistas são expressamente proibidos de dirigir qualquer Ferrari atual de rua sem permissão da fábrica. Então se eu quiser dirigir amanhã a 458 de um amigo, eu devo pedir autorização da fábrica. Será que eles vão me deixar dirigir o carro? Não: porque ele tem “uma origem desconhecida”, ou seja, não preparado. Fico até tentado a comprar uma 458, só pelo prazer de ligar para Maranello todas as manhãs e perguntar se há algum problema em levar meu filho à escola.

Um problema com o qual eu me deparei é ao usar carros de proprietários para testes comparativos. A Ferrari absolutamente odeia isso; mesmo que você diga as coisas mais bacanas do mundo sobre seus carros, eles ficam enfurecidos. Mas você quer ver uma 458 contra o GT3 RS então eu vou escrever um texto e produzir um vídeo. O mesmo com a 599 GTO e o GT2 RS. A Ferrari realmente acredita que pode controlar cada aspecto da mídia – ela interferiu ativamente algumas vezes em que eu pedi um carro emprestado a um de seus clientes.

A obsessão por controle está piorando: para o lançamento da FF em março, os jornalistas precisam informar para qual veículos estão escrevendo e eles devem ser aprovados por Maranello. Sinceramente, estamos perigosamente perto de ter as palavras e vereditos vetados pela assessoria de imprensa da Ferrari antes mesmo de publicarmos, o que é, por sinal, como as coisas funcionam em alguns mercados.

Será que eu deveria me importar com isso? Provavelmente não. Não é uma situação de vida ou morte; o mundo dos supercarros não é algo tão sério assim. Mas a melhor coisa sobre os fãs de carros é que eles deixam você dirigir seus carros, e a Ferrari não tem chance alguma de impedir que pessoas como eu guiem o que querem dirigir. Claro que suas tentativas para me atrapalhar tornam tudo isso um esporte ainda melhor e não abalam com a minha determinação, mas o triste é que seus carros são tão bons que não precisam de toda essa baboseira. Vou repetir a fim de manter algum vestígio de chance que eu possa ter de dirigir novamente um carro da Ferrari para a imprensa (que é virtualmente nula). Seus carros são tão bons que não precisam dessa baboseira.
Nada disso fará diferença para a Ferrari. Sou apenas um marujo irrelevante que não faz diferença. Mas já me cansei de esconder o que acontece, ao ponto de não ser mais dono de uma Ferrari, um integrante de fato deste monumento de controle. Vendi minha 575 antes do Natal. No que se refere a protestos, você precisa concordar que é um de qualidade.

Céus, isso está começando a soar como um resmungo deprimente. Vou terminar por aqui. Apenas lembre-se de tudo isso na próxima vez em que ler um comparativo de revista com um cavallino rampante.
Fonte: Jalopnik

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